APELAÇÃO. EXECUÇÃO FISCAL. MULTA AMBIENTAL. CDA BASEADA EM AUTO DE INFRAÇÃO SEM COMPROVAÇÃO DE AUTORIA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO DANO AMBIENTAL QUE NÃO PRESCINDE DE COMPROVAÇÃO DE AUTORIA E CAUSALIDADE. NÃO COMPROVAÇÃO DA AUTORIA. NULIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO. NULIDADE DA EXECUÇÃO. SENTENÇA MANTIDA. SUCUMBÊNCIA MAJORADA. ART. 85, § 11, DO CPC/2015.
Na hipótese dos autos, não restou demonstrado o nexo de causalidade entre a conduta da apelada e o dano ambiental ocorrido, destacando que, embora a responsabilidade ambiental seja objetiva, dispensando, portanto, a demonstração de culpa ou dolo por parte do infrator, remanesce a exigência de comprovação da autoria do ato ilícito e de sua causalidade em relação ao resultado danoso, o que não se verificou, na espécie, a confirmar a procedência do pedido inicial. Precedentes.
A responsabilidade objetiva em matéria ambiental não afasta a comprovação da autoria por parte da Administração, sob pena de insubsistência do auto de infração e de nulidade da respectiva multa, sendo que, na espécie, não restou evidenciada a autoria das infrações imputadas ao promovente, conforme se extrai dos fundamentos da sentença recorrida e, principalmente dos julgamentos proferidos nos processos administrativos correspondentes.
A responsabilidade objetiva, mesmo em matéria de dano ambiental, não tem a extensão de dispensar totalmente a demonstração, ainda que indiciária, da autoria e causalidade.
Sem a comprovação da autoria do incêndio, ainda que culposa, não é cabível a aplicação da multa, pois desborda-se da legalidade para o arbítrio.
Não obstante a responsabilidade pelo dano ambiental ser objetiva, há que ser comprovada a autoria do ato e a relação de causalidade entre o ato e o dano produzido. Na situação sob análise, pelo que dos autos consta, não é possível concluir que o suposto infrator provocou o incêndio e nem que tenha ele adotado conduta que viesse a contribuir para tal resultado.
Pelo contrário, os depoimentos das testemunhas ouvidas em juízo são uníssonos ao apontar que o executado envidou esforços para combater o alastramento do fogo, bem como que sofreu prejuízos materiais em decorrência do acontecido.
O que há, portanto, é uma mera suspeita, por parte do exequente, de que o executado tenha provocado o incêndio e, em seguida, lavrado o Boletim de Ocorrência, no intuito de dissimular a autoria do ilícito ambiental.
Essa tese se encontra desprovida de comprovação apta a atribuir-lhe um mínimo de verossimilhança, o que não permite ao julgador tomá-la como argumento bastante e suficiente para fundamentar um decreto condenatório.
Conclui-se, então, que se mostra correta a sentença ao desconstituir a CDA baseada em auto de infração sem comprovação da autoria do ilícito ambiental e, em consequência, reconhecer a nulidade da execução fiscal.
Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016 será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do CPC/2015 (enunciado Administrativo STJ nº 7).
Nesses termos, considerando que a apelação do IBAMA foi interposta depois de 18/03/2016, majoro os honorários advocatícios fixados em mais 5% (cinco por cento), nos termos do disposto no art. 85, § 11, do CPC/2015.
Apelação desprovida. (TRF-1 – AC: 00309418320184019199, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ AMILCAR MACHADO, Data de Julgamento: 27/04/2021, SÉTIMA TURMA, Data de Publicação: PJe 11/05/2021 PAG PJe 11/05/2021 PAG)
RELATÓRIO
A Exma. Sra. Juíza Federal LUCIANA PINHEIRO COSTA (Relatora Convocada): Trata-se de apelação interposta pelo IBAMA em face de sentença que acolheu a exceção de pré-executividade oposta pelo executado JOSÉ LEITE BERNARDES para reconhecer a nulidade da execução fiscal, extinguindo o feito sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, IV, do CPC/2015, por ser a CDA baseada em auto de infração sem comprovação de autoria.
Condenou o exequente no pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa.
O apelante alega que a responsabilidade pelo dano ambiental é objetiva, independendo de análise de culpabilidade. Aponta que o embargante não apresentou prova cabal e robusta de que não concorrera, de qualquer forma, para o ilícito ambiental, restringindo-se a meras alegações.
Pediu a reforma da sentença para que sejam julgados improcedentes os embargos e a condenação do embargante no pagamento das custas e honorários de sucumbência, inclusive recursais.
O embargante, em contrarrazões, aduz que a responsabilidade pelo dano ambiental é subjetiva e defende a ausência de nexo de causalidade entre a sua conduta e o dano ocorrido.
Requer a manutenção da sentença pelos seus próprios fundamentos e seja negado provimento ao recurso interposto pelo IBAMA.
É o relatório.
V O T O
Pelo que me é possível extrair dos autos, os fatos remontam ao ano de 2002, tendo o executado sido autuado por suposta prática de uso de fogo em sua propriedade rural localizada em São Roque de Minas-MG, em conduta que teria causado incêndio e dano ao meio ambiente.
Embora o processo administrativo não esteja juntado integralmente ao feito, há relatos no sentido de que o executado teria se dirigido ao local dos acontecimentos assim que deles cientificado e, uma vez lá, dirigido esforços no sentido de conter o fogo, bem como que teria lavrado Boletim de Ocorrência sobre o ocorrido e comunicado o incidente ao IBAMA e à Polícia Ambiental.
O IBAMA, ao tomar conhecimento dos fatos, autuou o executado por infração ao meio ambiente. O executado apresentou defesa administrativa que teria sido indeferida pelo Instituto Ambiental, com posterior constituição do crédito e sua inscrição em Dívida Ativa. Posteriormente, foi ajuizada a ação executiva fiscal.
Devidamente citado, o executado ofereceu bem à penhora e, uma vez garantida a execução, apresentou exceção de pré-executividade, asseverando não ter sido causador do incêndio que gerou danos inclusive à sua propriedade. A exceção foi acolhida pelo juízo, que decretou a nulidade da execução.
Estes, sucintamente, os fatos.
Não obstante a responsabilidade pelo dano ambiental ser objetiva, há que ser comprovada a autoria do ato e a relação de causalidade entre o ato e o dano produzido.
Na situação sob análise, pelo que dos autos consta, não é possível concluir que o suposto infrator provocou o incêndio e nem que tenha ele adotado conduta que viesse a contribuir para tal resultado.
Pelo contrário, os depoimentos das testemunhas ouvidas em juízo são uníssonos ao apontar que o executado envidou esforços para combater o alastramento do fogo, bem como que sofreu prejuízos materiais em decorrência do acontecido.
Confira-se, no mesmo sentido, os precedentes desta Corte Regional:
CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E AMBIENTAL. AÇÃO ANULATÓRIA. INCÊNDIO. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO DO ÓRGÃO COMPETENTE. INVASÃO PRÉVIA DA PROPRIEDADE. PROPRIETÁRIA VÍTIMA DOS CRIMES DE INVASÃO. AJUIZAMENTO DE AÇÃO POSSESSÓRIA. FATOS DEMONSTRADOS NOS AUTOS. NÃO COMPROVAÇÃO DA AUTORIA E DO NEXO DE CAUSALIDADE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. NÃO OCORRÊNCIA. INVALIDADE DA AUTUAÇÃO ADMINISTRATIVA.
I – Na espécie, não há como se imputar a autoria da infração ambiental à parte autora, na medida em que o referido incêndio se deu durante a invasão do imóvel rural de propriedade da promovente, conforme comprovam os documentos acostados aos autos, que noticiam a invasão da área desde 13/01/2009.
II – Nesse contexto, não há que se invocar a presunção de legitimidade do ato administrativo ou em alegações genéricas por parte da autora, uma vez que o acervo probatório evidencia que, bem antes da fiscalização do IBAMA ocorrer em 23/08/2010, já havia conflito na área de propriedade da autora, que estava sob a posse de terceiros. Ademais, não merece prosperar a alegação de que a autora foi omissa na defesa de suas terras, tendo em vista que tomou todas as medidas jurídicas cabíveis.
III – Na hipótese dos autos, não restou demonstrado o nexo de causalidade entre a conduta da apelada e o dano ambiental ocorrido, destacando que, embora a responsabilidade ambiental seja objetiva, dispensando, portanto, a demonstração de culpa ou dolo por parte do infrator, remanesce a exigência de comprovação da autoria do ato ilícito e de sua causalidade em relação ao resultado danoso, o que não se verificou, na espécie, a confirmar a procedência do pedido inicial. Precedentes.
IV – Remessa Oficial e Apelação do IBAMA desprovidas. Sentença confirmada. (destaquei)
(TRF-1. AC 0008677-19.2013.4.01.4100, Desembargador Federal Souza Prudente, Quinta Turma, DJe 21/06/2018)
DANO AMBIENTAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AUTORIA E CAUSALIDADE. PROVA INSUFICIENTE. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. AUSÊNCIA DE DECISÃO ESPECÍFICA. EXTREMA DIFICULDADE. CONDENAÇÃO EM INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL.
I – A responsabilidade objetiva em matéria ambiental não afasta a comprovação da autoria por parte da Administração, sob pena de insubsistência do auto de infração e de nulidade da respectiva multa, sendo que, na espécie, não restou evidenciada a autoria das infrações imputadas ao promovente, conforme se extrai dos fundamentos da sentença recorrida e, principalmente dos julgamentos proferidos nos processos administrativos correspondentes. Precedentes deste Tribunal.
II – São devidos honorários advocatícios pela Fazenda Pública em caso de sucumbência, os quais, no caso dos autos, devem ser arbitrados nos termos do inciso II do § 3º do art. 85 do novo CPC.
III – Remessa oficial e Apelação do ICMBIO desprovidas. (destaquei)
(TRF-1, AC 0003327-50.2013.4.01.3809, Juiz Federal Carlos Eduardo Castro Martins (Conv.), Quinta Turma, DJe 02/08/2016)
O que há, portanto, é uma mera suspeita, por parte do exequente, de que o executado tenha provocado o incêndio e, em seguida, lavrado o Boletim de Ocorrência, no intuito de dissimular a autoria do ilícito ambiental.
Ora, como já assinalado alhures, essa tese se encontra desprovida de comprovação apta a atribuir-lhe um mínimo de verossimilhança, o que não permite ao julgador tomá-la como argumento bastante e suficiente para fundamentar um decreto condenatório.
“A responsabilidade objetiva, mesmo em matéria de dano ambiental, não tem a extensão de dispensar totalmente a demonstração, ainda que indiciária, da autoria e causalidade.” (TRF-1, AC 0030767-44.2010.4.01.3900, Desembargador Federal João Batista Moreira, Quarta Turma, DJe 15/02/2016).
“Sem a comprovação da autoria do incêndio, ainda que culposa, não é cabível a aplicação da multa, pois desborda-se da legalidade para o arbítrio.” (TRF-1, AC 0015650-84.2003.4.01.3600, Desembargadora Federal Selene Maria de Almeida, Quinta Turma, Dje 18/05/2012).
Conclui-se, então, que se mostra correta a sentença ao desconstituir a CDA baseada em auto de infração sem comprovação da autoria do ilícito ambiental e, em consequência,
conhecer a nulidade da execução fiscal.
Ante o exposto, merece ser mantida a sentença.
É como voto.