O executado opôs embargos à execução de multa ambiental decorrente do Auto de Infração e do Termo de Embargo e Interdição do IBAMA aplicados com fundamento de que o executado teria promovido construção em promontório rochoso considerado como APP.
O magistrado, porém, julgou rejeitou os embargos à execução de multa ambiental, e inconformado, o embargante recorreu ao Tribunal enfatizando que somente após obter todas as licenças e autorizações necessárias é que iniciou a construção de residência, não se enquadrando o local em promontório rochoso.
Sendo este o único fundamento do autor de infração para caracterizar a área como de preservação permanente, e não sendo verídica tal afirmação, pediu que fosse reconhecida a nulidade do ato.
Sustentou ainda, que o Plano Diretor do Município de Florianópolis define a área como de preservação com uso limitado, com limite máximo de ocupação de 10%, requisito observado pelo autor, assim como todos os demais previstos em lei.
Ao analisar o recurso, o Tribunal declarou a nulidade do auto de infração e aplicação de multa, reconhecendo que a área não configura promontório, e que eventual existência de APP por fundamento diverso necessitaria de novo auto para qualquer cobrança pecuniária, e assim, foi extinta a execução fiscal de multa ambiental.
1. EMENTA DO JULGADO QUE ANULOU AUTO DE INFRAÇÃO DO IBAMA
EMBARGOS À EXECUÇÃO DE MULTA DECORRENTE DE AUTO DE INFRAÇÃO. AMBIENTAL. FUNDAMENTAÇÃO DO AUTO. INVERÍDICA. NULIDADE RECONHECIDA. PERDA DA PRESUNÇÃO DE LIQUIDEZ, CERTEZA E EXIGIBILIDADE.
Auto de infração fundamentado em construção em promontório rochoso. Aplicação de multa. Reconhecimento de que a área não configura promontório.
Nulidade do auto de infração. Eventual existência de APP por fundamento diverso necessita de novo auto para qualquer cobrança pecuniária.
Anulação do licenciamento feito pela autoridade competente. Imperioso e fundamentado. Inexistente no caso dos autos.
(TRF-4 – AC: 50123503120114047200 SC 5012350-31.2011.4.04.7200, Relator: MARIA LÚCIA LUZ LEIRIA, Data de Julgamento: 28/11/2012, TERCEIRA TURMA)
2. LEIA O VOTO QUE ANULOU O AUTO DE INFRAÇÃO E EXTINGUIU A EXECUÇÃO FISCAL
O meio ambiente ecologicamente equilibrado é protegido pelo art. 225 da CRFB/88, e sua proteção é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, conforme art. 23, VI e VII, da CRFB/88.
Cabe a cada uma destas esferas de governo, nos termos da lei e do interesse preponderante, fiscalizar, licenciar e, em havendo necessidade, autuar.
Neste ponto destaco que os fatos são analisados e julgados conforme a época em que ocorreram, nos moldes da legislação então vigente, descabendo qualquer pretensão de aplicar norma nova a fatos pretéritos.
A Lei 6.938/81 dispôs acerca da Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA), tendo por “objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento sócio-econômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana” (art. 2º).
O art. 2º da Lei 4.771/65 (Código Florestal) traz definições de Área de Preservação Permanente – APP a serem respeitadas, reguladas pelas Resoluções CONAMA 237/97 e 303/02 prevendo, ainda a interpretação conjunta desta norma com os planos diretores municipais para edificação nos perímetros urbanos.
Neste ponto, especificamente a Resolução 303/02 indica os requisitos que definem a área como urbana, sujeitando-a à normas específicas de garantia de construção e urbanização.
Em síntese, a proteção ambiental é direito fundamental que deve ser analisado sob a égide do interesse público atual e das futuras gerações, inclusive considerando o direito à moradia e a pretensão imponderável e irremediável de progresso.
Desta forma, as questões afetas ao direito ambiental, sem dúvida tendo como orientação primordial o meio, devem ser julgadas com proporcionalidade e razoabilidade.
Vejamos o caso dos autos.
No início da década de 2000, o apelante adquiriu um imóvel no Município de Florianópolis/SC, e em seguida postulou e obteve junto à municipalidade os alvarás para construção de casa de alvenaria.
A área foi declarada pelo Município como APL (Área de Preservação de Uso Limitado) e ATR (Área Turística Residencial). Em 2005 foi notificado pelo IBAMA:
Auto de infração ambiental: Destruir floresta considerada de preservação permanente em área de uma fração de hectare para construção civil nas coordenadas (…)” “Termo de Embargo e Interdição: Fica embargada a construção instalada nas coordenadas (…)”
O fundamento para a autuação, com fixação de multa, segundo Laudo Técnico de Vistoria do IBAMA é a construção em Promontório Rochoso, caracterizado este como Área de Preservação Permanente.
Vê-se, pois, deste sintético resumo da questão fática dos autos, que o fundamento da autuação da autarquia federal desconsidera o licenciamento municipal que, pelo que se depreende dos autos, não foi anulado.
O Município de Florianópolis manifesta-se nos autos no sentido de que que “no caso em exame é leviano se falar em construção irregular, uma vez que a mesma foi devidamente aprovada, obedeceu ao zoneamento previsto e recebeu o correspondente alvará da municipalidade, portanto, tal construção já foi tecnicamente e legalmente prevista na legislação urbanística”.
Também do conjunto probatório dos autos tem-se que ao longo das aferições no local, nos autos do Processo administrativo, o próprio IBAMA reconhece a possibilidade do local não se caracterizar como promontório.
Trata-se de área urbana, em encosta de morro, com plano diretor homologado e elaborado pela Prefeitura Municipal, não configurando dano que ultrapasse os limites da municipalidade.
Em que pese a competência do IBAMA em caso de omissão da autoridade ambiental competente para o exame de atividade de interesse local, o caso dos autos não configura tal hipótese legal.
A autoridade competente atuou e o IBAMA em qualquer momento impugna diretamente esta atuação, não podendo o particular restar responsabilidade diretamente, neste momento, por eventual infração chancelada pela municipalidade.
Entendo que o autor, de posse de licenciamento e autorização municipais construiu em Área de Preservação do Uso Limitado, forte na Lei Municipal.
Em contrapartida, as declarações do órgão federal que fundamentam a penalidade, além de não buscar a anulação das licenças e autorizações, tem como lastro fundamental caracterizar-se o local como promontório rochoso, o que traria a área para a preservação permanente.
Tal situação é afastada na prática. Ou seja, a área não é de promontório. Entendo que tal fato é suficiente para afastar a fundamentação da penalidade.
É que o Auto de Infração e o título que lastreia a cobrança da penalidade pecuniária administrativa gozam da presunção de liquidez, certeza e exigibilidade. Imperioso para tanto que suas afirmações encontrem correspondência com a realidade fática. Incabível a cobrança de penalidade por construção em promontório rochoso quando este não existe.
Mesmo que tenha havido no local alguma infração ambiental, é necessária a lavratura de novo auto de infração, correspondendo com os fatos narrados, sendo ainda de se relembrar que o cidadão tem a seu dispor a municipalidade e suas licenças, devendo o órgão ambiental federal justificar sua atuação mediante anulação destas.
Entendo, pois, que, afastadas a liquidez, certeza e exigibilidade, os embargos à execução devem ser julgados procedentes, extinguindo-se a respectiva ação de execução da multa, nos moldes da fundamentação supra.
Enfatizo, por fim, que mantenho a sentença quanto à declaração de legitimidade do autor para figurar no auto de infração do IBAMA, seja porque não regularizada a situação de compra e venda do imóvel a terceiro, seja porque todos aqueles que participaram da cadeia em eventual dano ambiental por ele são responsáveis, conforme entendimento consolidado nas Cortes Pátrias.
Ante o exposto, voto por dar provimento ao apelo do embargante.