APELAÇÃOCRIMINAL – DECISÃO INTERLOCUTÓRIA – CRIME AMBIENTAL – ARTIGOS 54, 48, AMBOS DA LEI 9.605/98 – IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL – ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA EM RELAÇÃO AO DELITO PREVISTO NO ART. 54, CAPUT – PRETENDIDA DESCONSTITUIÇÃO DO DECISUM – ALEGADA TIPICIDADE DA CONDUTA – INOCORRÊNCIA -FATO TÍPICO QUE EXIGE COMPROVAÇÃO DOS DANOS CAUSADOS -IMPRESCESTDIBILIDADE DE LAUDO PERICIAL A DETERMINAR A EXTENSÃO DO NÍVEL DE POLUIÇÃO – INEXISTÊNCIA DE PERÍCIA NOS AUTOS – IMPOSSIBILIDADE DE REALIZAÇÃO – FATO OCORRIDO NO ANO DE 2005 – DECISÃO MANTIDA – EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELA OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA – DELITO DO ART. 48 – ALEGAÇÃO DE QUE SE TRATA DE CRIME PERMANENTE – TESE NÃO ACOLHIDA – CRIME INSTANTÂNEO DE EFEITOS PERMANENTES -RECURSO DESPROVIDO.
Para configuração do crime do art. 54 da Lei nº 9.605/98 não basta comprovação de utilização de fogo, sem autorização do órgão ambiental competente. Necessária prova de que a poluição se deu em nível elevado e que por tal motivo, tenha causado danos e mortandade da fauna e flora do local, como descrito na denúncia. In casu a ausência de laudo pericial e a impossibilidade de realiza-lo conduzem à atipicidade da conduta.
O delito previsto no art. 48 da lei de crimes ambientais constitui crime instantâneo de efeitos permanentes, de modo que a sua consumação dá-se de imediato, embora seus efeitos protraiam-se no tempo, independentemente da vontade do agente.
Assim, mantém-se a decisão recorrida, que reconheceu a prescrição da pretensão punitiva estatal quanto ao referido delito, ocorrido no ano de 2005. (Ap 154903/2013, DES. RUI RAMOS RIBEIRO, PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL, Julgado em 21/10/2014, Publicado no DJE 28/10/2014)
(TJ-MT – APL: 00002680820088110094 154903/2013, Relator: DES. RUI RAMOS RIBEIRO, Data de Julgamento: 21/10/2014, PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 28/10/2014)
RELATÓRIO
O Ministério Público Estadual interpôs recurso de apelação criminal visando reformar sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Tabaporã/MT, nos autos da ação penal nº 268-08.2008.811.0094 (Código 8629), a qual absolveu sumariamente o acusado de praticar o delito insculpido no artigo 54, caput, da Lei nº 9.605/98; declarou extinta a sua punibilidade , pela ocorrência da prescrição, em relação aos delitos prescritos nos arts. 48 e 50, caput, da Legislação Ambiental; e reconheceu a prática do delito previsto no art. 38 do mesmo Diploma Legal que, por ter pena mínima de 01 (um) ano de detenção, ordenou a intimação do Ministério Público para possível proposição de suspensão condicional do processo.
O Órgão Ministerial irresignado, interpôs o presente recurso (fl. 188) onde, em suas razões (fls. 193/206), almeja a reforma do decisum, a fim de que seja desconstituída a sentença que absolveu sumariamente o apelado em relação ao delito previsto no art. 54, caput, e que reconheceu a prescrição do delito tipificado no art. 48, ambos da Lei dos Crimes Ambientais, determinando o prosseguimento regular do feito.
Prefacialmente afirma que “a absolvição sumária constitui uma espécie de julgamento antecipado e, diante disso, exige um juízo de certeza. (sic fl. 195), e que este não é o caso dos autos.
Afirma que “a materialidade delitiva na presente está estribada nos documentos da lavra da SEMA e reforçada pela própria defesa do apelado que confirmou os desmates e queimada em sua propriedade, ainda que os impute ao vizinho Edson Melozzi. (…) “subsistem fortes indícios de autoria contra o apelado, proprietário da Fazenda Santa Terezinha. (…). Ainda, que “a falta de perícia, neste momento, não pode obstar a persecutio criminis in iudicio, pois não se apresenta como exigência intransponível, capaz de determinar a nulidade de toda a ação penal, até porque o exame de corpo de delito pode ser realizado a qualquer tempo (…).” (sic fls. 197/198)
Em relação à absolvição sumária do acusado pelo delito do artigo 54, caput, da Lei 9.605/98, assevera que não há nos autos hipótese prevista no art. 397, do CPP, que autorize tal absolvição, impondo a retomada do curso processual para esclarecimento dos fatos sob o crivo do contraditório e da ampla defesa.
Quanto ao delito do artigo 48, sustenta que “(…) não prospera o entendimento do Magistrado a quo, no que tange a absorção da conduta prevista no art. 48 pela do art. 38 da Lei 9.605/98 (…), e que, “o apelado utilizou-se da área desmatada ilegalmente para formação de pastagem.
Assim, a partir do momento em que impediu a regeneração natural da flora em cuja área não tinha autorização para desmate, estará cometendo a conduta descrita no art. 48 da Lei n. 9.605/98, pela prorrogação do momento consumativo, característico dos crimes permanentes (sic fl. 203).
Por considera-lo como crime permanente, aduz que o lapso prescricional somente começa a fluir do momento em que cessa a permanência, conforme previsão do art. 311, inciso III, do Código Penal.
Em contrarrazões, o apelado pugnou pela manutenção da sentença recorrida, requerendo o desprovimento do presente recurso (fls. 207/216).
Instada a se manifestar a douta Procuradoria Geral de Justiça, através da eminente Procuradora de Justiça Eliana Cícero de Sá M. Ayres, manifestou-se pelo conhecimento do apelo e seu desprovimento (fls. 221/226), assim sintetizando:
“ SUMÁRIO: Apelação criminal – Meio Ambiente – Atipicidade da conduta descrita no artigo 54 da lei nº 9.605/98 e a desclassificação do artigo 48 para o artigo 38 do mesmo diploma legal – Irresignação ministerial quanto a absolvição do apelado – Ausência de laudo pericial capaz de demonstrar o dano ambiental provocado pelo recorrido – Falta de provas de que o recorrido efetivamente dificultou ou impediu a regeneração da área devastada ou o estado de recuperação da vegetação – Comprovação que depende da realização de exame técnico in loco para sua constatação – Sentença que merece ser mantida.
À douta revisão. É o relatório.
VOTO
Trata-se recurso de apelação criminal do Ministério Público interposto visando reformar decisão proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Tabaporã/MT. A exordial acusatória restou assim lavrada:
“Assim o faz porque na data de 26 de outubro de 2007, agentes de fiscalização da SEMA, em diligência fiscalizatória, constataram:
Fato 1 – que no ano de 2005 houve a danificação de 800,057 hectares de floresta nativa, objeto de especial preservação, qual seja Floresta Amazônica, consoante revelado pela carta imagem do polígono;
Fato 2 – que o desmatamento levado a efeito no local implicou na danificação de 0,274 hectares de floresta considerada de preservação permanente, vez que às margens de curso d’água;
Fato 3 – que desde então desenvolve-se no local a atividade econômica de formação de pastagens, para a prática da pecuária, de molde a impedir ou dificultar a regeneração da Floresta Amazônica;
Fato 4 – que foi utilizado fogo em 500 hectares de área agropastoril, nas coordenadas geográficas S 11º 01’ 26,8” e W 56º 37’ 52,3”, sem autorização do órgão ambiental, o que causou poluição atmosférica de molde a provocar danos e mortandade da fauna e flora do local. (…).”
Na mesma oportunidade, o representante do Ministério Público requereu a realização de prova pericial, por dois servidores do IBAMA, portadores de curso superior na área ambiental, na forma do art. 159 e parágrafos, do CPP, sendo estes os quesitos ministeriais:
1) A propriedade rural denominada Fazenda está plotada em quais coordenadas geográficas?
2) As coordenadas geográficas objeto do auto de infração 100613, da SEMA, estão posicionadas dentro dos limites territoriais da Fazenda?
3) A cobertura arbórea da Fazenda Santa Terezinha é da tipologia Floresta ou Cerrado?
4) O imóvel rural em questão tem pelo menos 80% da área total com cobertura arbórea, isto é, a área de reserva legal está preservada?
5) Na propriedade rural Fazenda houve o desmatamento de quantos hectares de floresta para a formação de pastagens ou agricultura?
6) Em que ano ocorreu o desmatamento objeto da carta imagem de satélite?
7) Houve o efetivo desmate de quantos hectares em área de preservação permanente? É verdadeiro dizer que o desmate da app foi feito na mesma época do desmatamento verificado nas cartas imagens?
8) Existe área de preservação permanente sendo ocupada com pastagens ou atividades agrícolas?
9) As pastagens ou atividades agrícolas existentes na Fazenda Santa Terezinha estão impedindo ou dificultando a regeneração natural de floresta ou outra forma de vegetação?
10) Qual a principal atividade econômica desenvolvida na Fazenda Santa Terezinha?
11) Em que época foi utilizado fogo em 500 hectares de área agropastoril na Fazenda Santa Terezinha?
12) O fogo foi utilizado voluntariamente para o fim de limpeza (e renovação) de pastagens?
13) O fogo foi capaz de causar poluição atmosférica hábil a provocar danos e mortandade de espécime da fauna e flora?
14) Qual a data aproximada em que foi feito uso de fogo na propriedade Santa Terezinha?
Diante destes fatos, o Ministério Público Estadual imputou ao recorrido a prática das condutas descritas como crime nos artigos seguintes:
Fato 1 – art. 50 da Lei Federal 9.605/98;
Fato 02 – art. 38, caput, da Lei Federal 9.605/98;
Fato 03 – art. 48 da Lei Federal 9.605/98; e
Fato 04 – art. 54 da Lei Federal 9.605/98.
Contudo o magistrado absolveu sumariamente o acusado do delito insculpido no artigo 54, caput, da Lei nº 9.605/98; declarou extinta a sua punibilidade, pela ocorrência da prescrição, em relação aos delitos prescritos nos arts. 48 e 50, caput, da Legislação Ambiental; e reconheceu a prática do delito previsto no art. 38 do mesmo Diploma Legal que, por ter pena mínima de 01 (um) ano de detenção, ordenou a intimação do Ministério Público para possível proposição de suspensão condicional do processo.
Pois bem, objetiva, o Órgão Ministerial, a desconstituição da decisão que absolveu sumariamente o apelado, em relação ao delito previsto no art. 54, caput, e que reconheceu a prescrição do delito tipificado no art. 48, ambos da Lei dos Crimes Ambientais, determinando o prosseguimento regular do feito.
Para melhor compreensão do pleito ministerial, necessário a transcrição de parte da sentença objurgada: “(…)
Nos termos do artigo 397 e incisos do CPP, com arrimo no parecer ministerial de fls. 169/182, decido:
Do artigo 50, “caput”, da Lei n. 9.605/98
A pretensão punitiva estatal, quanto à acusação de infringência do artigo 50, “caput”, da Lei n. 9.605/98, encontra-se prescrita, tendo em vista que o fato ocorreu no ano de 2005. Senão vejamos:
Em sua douta manifestação (fls. 179), o órgão de acusação assevera que: “O preceito secundário da norma penal incriminadora descrita no art. 50, “caput”, da Lei 9.605/98, comina a pena de detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano e multa.
Diante disto, contata-se que a pretensão punitiva estatal prescreve em 4 (quatro) anos, tendo por termo a quo a data do fato, ex vi do disposto no art. 109, V do Diploma Repressivo.”.
Continuando “A pena de multa, também cominada ao delito, prescreve no mesmo prazo, por força do art. 114, inc. II, do mesmo Codex.
Considerando que o fato ocorreu no ano de 2005, conclui-se que a prescrição operou em 2009.”.
Finalizando no sentido de que “Com efeito, não é mais possível a instauração de ação penal pelo crime em comento, em desfavor do denunciado, eis que atingido o tempo máximo para a persecução penal, sendo que ao tempo do recebimento da denúncia, 22/04/2010, a conduta já estava prescrita.
Assim, com supedâneo nos dispositivos legais retro transcritos c.c. artigo 107, inc. IV, primeira figura, do Digesto Penal, há de ser decretada a extinção da punibilidade do denunciado pelo crime disposto no art. 50, “caput” da Lei Ambiental n. 9.605/98.”.
Do artigo 54, “caput”, da Lei n. 9.605/98
Compulsando os autos, principalmente os laudos e relatórios, acostados com a denúncia às fls. 27/8, de lavra da Secretaria de Estado do Meio Ambiente – SEMA – do Estado de Mato Grosso, não se verifica em nenhum momento a constatação do crime descrito no artigo 54, “caput”, da Lei n. 9605/98.
A norma penal incriminadora tipifica que “Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora:”.
Na verdade, segundo relatório técnico (fls. 28), de n. 038/07/SEMA/D. R. JUARA – MT, “constatou-se a veracidade da mesma onde pode-se encontrar um área de 803,057 hectares de área desmata para formação de pastagem. Foi encontrada também uma área com cerca de 500 hectares de área queimada nas coordenadas geográficas S11º 01´26,8” e W 056º 37´52,3”.
No mesmo sentido, no auto de infração de fls. 30 não se relata, na “DESCRIÇÃO DA OCORRÊNCIA”, a existência do crime descrito no artigo 54 da Lei Ambiental.
Ademais, o auto de inspeção n. 120811, acostado às fls. 32, deixa claro que a ocorrência tratava-se de destruição da vegetação nativa, com uso de fogo e desmate, para fins agropastoris.
Não há, na denúncia ministerial, descrição de atividade causadora de poluição que possa resultar em danos à saúde humana ou que tenha destruído a flora significativamente. O que houve, de fato, foi destruição deliberada da vegetação com uso de fogo ou de desmate.
Outrossim, sem um embasamento material mínimo, em suas quesitações, a denúncia pede que a perícia oficial ateste em que época foi utilizado o fogo, se o fogo foi utilizado voluntariamente e se o fogo foi capaz de causar poluição atmosférica, conforme transcrição a seguir:
“11) Em que época foi utilizado fogo em 500 hectares da área agropastoril na Fazenda Santa Terezinha?”;
“12) O fogo foi utilizado voluntariamente para o fim de limpeza (e renovação) de pastagens?”;
“13) O fogo foi capaz de causar poluição atmosférica hábil a provocar danos e mortandade de espécimes da fauna e flora?”.
Portanto, o grau de incerteza, para um crime de dano efetivo, e não em potencial, é muito grande para poder embasar a materialidade da denúncia.
No caso em testilha, segundo atestado pelos agentes estatais, não foi a poluição decorrente do fogo que causou a destruição da flora, mas, antes, o fogo foi o meio direto para destruição da flora.
Isso posto, com essas breves consideração, denota-se a atipicidade da conduta, assim como a ausência de justa causa para o oferecimento da denúncia, já que, não há, lastro probatório mínimo para o crime em questão.
Dos artigos 38 e 48 da Lei n. 9.605/98
O delito descrito no artigo 38 da Lei do Crimes Ambientais descreve que “Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção:”, possui como preceito secundário a imposição da pena de detenção de 01 (um) a 03 (três) anos, ou multa, ou ambas cumulativamente.
O delito insculpido na norma tipificada no artigo 48, por sua vez, assevera que “Impedir ou dificultar a regeneração de florestas ou demais formas de vegetação:”, possui a pena de detenção, de seis meses a um ano, e multa.
Ocorre que, de acordo com o relato contido na denúncia, corroborado pelos documentos lavrados pelos agentes de fiscalização, atestam que houve apenas um ato de destruição da área, com utilização de derrubada e fogo para destruir a vegetação nativa.
Ocorre conflito aparente de normas quando há incidência de mais de uma norma repressiva numa única conduta delituosa, sendo que tais normas possuem entre si relação de hierarquia ou dependência, de forma que somente uma é aplicável.
Regra geral, não há “ação autônoma de destruir floresta ou de impedir sua regeneração, mas tão-somente o ato destruir a vegetação, que tem, na destruição, condição necessária o impedimento à regeneração, observando-se ainda que foi a finalidade, agrária, da derrubada.”.
Não se cogita, ademais, de concurso material, entre a técnica de derrubada e utilização do fogo como meio de destruição, já que, mutatis mutandis, por exemplo, se num homicídio, o agente primeiramente usasse faca como meio de matar, e num segundo momento, usasse de fogo, estaríamos ainda diante de um único crime de homicídio.
Assim, conclui-se que, com vários atos, deu-se, em tese, um único crime perpetrado contra o meio-ambiente, conforme descrito no artigo 38 da Lei n. 9.605/98 e por ter consumido o delito menos grave contido na norma do artigo 48.
Do artigo 48 da Lei n. 9.605/98
Em que pese ser crime permanente, o qual só cessa quando cessados os atos executórios, os documentos que embasaram a denúncia atestam que só houve uma destruição na vegetação daquela área.
Não existindo atos que denotem a intenção de impedir o ressurgimento da vegetação nativa.
Considerando que o fato ocorreu no ano de 2005, conclui-se que a prescrição operou em 2009.
Com efeito, não é mais possível a instauração de ação penal pelo crime em comento, em desfavor do denunciado, eis que atingido o tempo máximo para a persecução penal, sendo que ao tempo do recebimento da denúncia, 22/04/2010, a conduta já estava prescrita.
Assim, com supedâneo nos dispositivos legais retro transcritos c.c. artigo 107, inc. IV, primeira figura, do Código Penal, há de ser decretada a extinção da punibilidade do denunciado pelo crime disposto no art. 48 da Lei Ambiental n. 9.605/98.
Isso posto, nos termos do artigo 397, incisos III e IV, todos do Código de Processo Penal, declaro:
- que o fato narrado na denúncia não encontra tipicidade noartigo 54 da Lei n. 9.605/98, sendo, portanto, atípico;
- que os delitos, imputados ao réu, descritos nos artigos 48 e 50da Lei n. 9.605/98, estão prescritos pela perda da pretensão punitivapropriamente dita;
- finalmente que, em tese, o delito inscrito no artigo 48 da Leidos Crimes Ambientais, para o caso em testilha, estaria absorvido peloartigo 38 do mesmo diploma legal.
Considerando-se que o delito inscrito no artigo 38 da Lei n. 9.605/98 possui pena mínima de 01 (um) ano de detenção, cientifique-se o órgão ministerial sobre a possibilidade de proposta de suspensão condicional do processo. (…).”
Passa-se, então, ao exame dos autos.
Prima facie ressalto que, embora o douto Magistrado a quo tenha afirmado que o delito previsto no artigo 48 da Lei dos Crimes Ambientais estaria absorvido pelo tipificado no art. 38 do mesmo Diploma Legal, não considerou tal circunstância, uma vez que feitas as ponderações que entendeu pertinentes, reconheceu a prescrição do delito em comento, com a seguinte conclusão:
“Assim, com supedâneo nos dispositivos legais retro transcritos c.c. artigo 107, inc. IV, primeira figura, do Código Penal, há de ser decretada a extinção da punibilidade do denunciado pelo crime disposto no art. 48 da Lei Ambiental n. 9.605/98.”
Crime do artigo 54, “caput”, da Lei n. 9.605/98 – Absolvição Sumária.
Aduz, em síntese, que não há nos autos, hipótese prevista no art. 397, CPP, que a autorize a absolvição sumária do apelado em relação ao delito previsto no art. 54, caput, da Lei 9.605/98.
Primeiramente ressalto, que para tipificação do delito é imprescindível atestar a intensidade da poluição e sua potencialidade, que deverão ser demonstradas através de prova idônea para confirmar o risco de lesão à saúde, ainda que seja de um ou alguns indivíduos, ou a morte de animais e degradação significativa da flora.
Assim, dispõe o art. 54, da Lei nº 9.605/98:
“Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora.
Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa”.
Com efeito, a prova dos autos é insuficiente para comprovar a prática, pelo acusado, do delito de causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativada flora, pela utilização de fogo, sem autorização do órgão ambientalcompetente.
Com efeito, não é qualquer poluição que será capaz de tipificar o fato no art. 54 da Lei n.º 9.605/1998. É preciso que se avaliem os níveis da poluição. Somente aquela produzida em níveis tais que possam resultar perigo à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou destruição significativa de flora, é que se enquadrará no referido tipo penal.
Assim, para a tipificação do delito do art. 54, é imprescindível atestar a intensidade da poluição e sua potencialidade, que deverão ser demonstradas através de prova idônea para confirmar o risco de lesão à saúde, ainda que seja de um ou alguns indivíduos,ou a morte de animaise degradação significativade flora.
Não basta, pois, a demonstração de que foi utilizado fogo, sem autorização do órgão ambiental, sendo necessário preencher a exigência ditada na cabeça do dispositivo, ou seja, gerar dano à saúde ou a mortandade de animais ou mesmo a destruição significativada flora.
Neste sentido, como bem destacou a ilustrada Procuradora de Justiça, ao se manifestar:
“(…) Urge destacar, por oportuno, que o crime do artigo 54 da Lei n.º 9.605/98, são classificados como crimes de perigo abstrato ou concreto, que se coaduna com o princípio da proteção, que rege o direito ambiental, firmando-se o entendimento de que, para sua configuração, basta o perigo potencial ao bem jurídico protegido, sendo portanto, desnecessário a comprovação do dano efetivo.
No caso versando, os agentes da Secretaria de Estado do Meio Ambiente/SEMA, constataram que na Fazenda Santa Terezinha, houve desmate com uso de fogo em área agropastoril e em área de preservação permanente (APP), causando poluição e danos e, mortandade da fauna e da flora de forma significativa, conforme se constata do auto de infração de fls. 30.
Conforme cediço, na norma analisada, a poluição é considerada criminosa quando gerar danos à saúde humana, ainda que de forma potencial, ou ainda efetivamente provocar morte de animais ou destruição significativa da flora e da fauna.
Todavia, compulsando os autos não se observa a existência de documentos técnicos (laudo pericial) elaborados por autoridade competente, assinalando, de forma expressa, o perigo de dano grave ou irreversível ao meio ambiente.
Assim, ausente laudo pericial, diligência ou mesmo relatórios elaborados, demonstrando que a conduta imputada ao recorrido, de fato, provocou a poluição de qualquer natureza em nível suficiente a comprovar o impacto ambiental, restou, insubsistente a materialidade delitiva.
É nesse mesmo sentido o entendimento desse Sodalício:
“APELAÇÃO – CRIME AMBIENTAL – ARTIGO 54, § 2º, INCISO V, DA LEI 9.605/98 – ABSOLVIÇÃO – IRRESIGNAÇÃO MNISTERIAL – PRETENDIDA CONDENAÇÃO – ALEGADA SUFICIÊNCIA DE PROVAS DA AUTORIA E MATERIALIDADE
DELITIVA – INVIABILIDADE – FATO TÍPICO QUE EXIGE COMPROVAÇÃO DE IMPACTO AMBIENTAL RELEVANTE -IMPRESCINDIBILIDADE DE LAUDO PERICIAL A DETERMINAR A EXTENSÃO DO DANO AO MEIO AMBIENTE -INEXISTÊNCIA DE ESTUDO AMBIENTAL NOS AUTOS – RECURSO DESPROVIDO.
Tendo-se em vista que o próprio legislador indicou como conduta penalmente relevante apenas aquela que produziu ou possa vir a produzir grande impacto ambiental, demonstrando risco à saúde humana e à fauna e flora local, e atento à ausência nos autos de estudo que comprove se realmente ocorreu dano ambiental, e a possível extensão deste, imperativa é a absolvição dos apelados, ante a exiguidade de provas à confirmação da materialidade delitiva.”{TJ/MT, Ap. Crim. n.” 81.138/2011,
Relator: DES. RONDON BASSIL DOWER FILHO, TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL, Data do Julgamento 12/06/2013, Data da publicação no DJE 02/07/2013)
Em suma, conclui-se a sentença objurgada acha-se escorreita, reputando, atípica, o delito descrito na peça de átrio, pela ausência dos requisitos formais previstos no artigo 41 do Código de Processo Penal. (…).”
Sobre o tema, tem decidido o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:
“APELAÇÃO-CRIME. AMBIENTAL. ART. 54, § 2º, INC. V, DA LEI Nº 9.605/98. Uma vez que o tipo penal do art. 54, § 2º, inc. V, da Lei nº 9.605/98, exige prova de que a poluição resulte danos à saúde humana, ou provoque a mortandade de animais, ou a destruição significativa da flora, em face do lançamento de resíduos líquidos, em desacordo com as exigências em leis ou regulamentos, em não havendo prova da intensidade da poluição, bem como de sua potencialidade, é de ser mantida a absolvição. APELAÇÃO DESPROVIDA. (TJ-RS – ACR: 70057132516 RS ,
Relator: Rogerio Gesta Leal, Data de Julgamento: 12/12/2013, Quarta Câmara Criminal, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 20/01/2014).”
“APELAÇÃO. CRIME DE POLUIÇÃO AMBIENTAL. Para configuração do crime do art. 54 da Lei nº 9.605/98 não basta comprovação de lançamento de resíduos líquidos ao solo, em desacordo com as exigências legais. Necessária prova de que tenham causado prejuízo à saúde, como descrito na denúncia. Ausência de laudo pericial. Prova testemunhal frágil para conferir certeza necessária à formação de juízo condenatório. A ausência de perícia conduz à absolvição. Apelo ministerial improvido e apelo da defesa provido. ( Apelação Crime Nº 70050187681, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Aristides Pedroso de Albuquerque Neto, Julgado em 13/12/2012)”
“APELAÇÃO. CRIMES AMBIENTAIS. ART. 39, ART. 54, § 2º, INCISO V, E ART. 60, DA LEI Nº 9.605/98. POLUIÇÃO EM ALTO NÍVEL. CORTE DE ÁRVORES EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. AUSÊNCIA DE PROVA. Ausente prova segura da ocorrência de poluição em alto nível, bem como de que o corte de árvores nativas teria acontecido em área de preservação permanente, deve ser mantido o decreto absolutório. Apelação do Ministério Público, improvida. Provido o apelo da defesa, para declarar a extinção da punibilidade, pela ocorrência da prescrição retroativa. ( Apelação Crime Nº 70047753348, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Gaspar Marques Batista, Julgado em 14/06/2012)”
“CRIME AMBIENTAL. ART. 54, § 2º, INC. V, DA LEI 9.605/98. POLUIÇÃO. PROVA. ABSOLVIÇÃO. O crime do art. 54 da Lei n.º 9.605/98 tem sua consumação sujeita à demonstração efetiva do resultado poluição, em níveis tais que resulte ou possa resultar danos à saúde humana. Indispensável, pois, à responsabilização penal dos imputados, a avaliação dos níveis da poluição efetivamente havida, bem assim a sua potencialidade de causar dano à saúde humana, aferições que não aportaram aos autos. Apelos providos para absolver os acusados, com acolhimento e transcrição do parecer ministerial. (Apelação Crime Nº 70043352293, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marcelo Bandeira Pereira, Julgado em 11/08/2011)”
No caso, constatou-se que o apelado utilizou fogo em 500 hectares de área agropastoril, nas coordenadas geográficas S 11º 01’ 26,8” e W 56º 37’ 52,3”, sem autorização do órgão ambiental.
No entanto, falece o processo de elementos de prova que indiquem a efetiva poluição, bem como que esta tenha produzido riscos à saúde humana ou a mortandade de animaise destruição de flora, nos termos do art. 54 da Lei de Crimes Ambientais.
Ressalte-se ainda, a impossibilidade de realização de perícia técnica na área, pois o delito foi cometido no ano de 2005, há quase 10 (dez) anos.
Assim, a falta da prova de que a poluição resultasse danos à saúde humana, ou provocasse a mortandade de animais, ou a destruição significativa da flora, de rigor a manutenção da absolvição.
Crime do artigo 48 da Lei nº 9.605/98 – Prescrição – Extinção da Punibilidade.
O recorrente alega que não houve a prescrição de tal delito, pois sendo considerado “crime permanente”, o lapso prescricional somente começa a fluir do momento em que cessa a permanência, conforme previsão do art. 311, inciso III, do Código Penal.
Sem razão o apelante.
O preceito secundário do art. 48 da Lei 9.605/1998, prevê pena de detenção de seis meses a um ano , e multa.
O art. 109, inciso VI, do Código de Processo Penal, prescreve:
“Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no § 1º do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se: (…)
VI – em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano.”
No que se refere ao momento de consumação, os delitos podem ser instantâneos, permanentes e instantâneos de efeitos permanentes. Os instantâneos correspondem àqueles delitos que se completam em um só momento, sem continuidade de tempo. A consumação ocorre em determinado momento e não mais prossegue. É o que ocorre, por exemplo, com os crimes de furto e homicídio (arts. 155 e 121 do Código Penal).
Os crimes permanentes são os que causam uma situação danosa ou perigosa que se prolonga no tempo por vontade do agente. A título de ilustração, no crime de sequestro e cárcere privado (art. 148 do Código Penal), a consumação protrai-se, alonga-se durante todo o tempo em que o ofendido fica privado de sua liberdade. O estado de flagrância permanece enquanto a liberdade não for restituída e, assim, a prisão em flagrante pode ocorrer a qualquer momento.
Por seu turno, nos crimes instantâneos de efeitos permanentes, embora a sua consumação ocorra em determinado momento, os efeitos permanecem, independentemente da vontade do sujeito ativo, como se dá, por exemplo, com o crime de bigamia (art. 235 do Código Penal).
Sob esse prisma, a despeito da bem lançada argumentação do Ministério Público, entendo que o delito tipificado no art. 48 da Lei de Crimes Ambientais– impedir ou dificultar a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação -, cuida-se de crime instantâneo de efeitos permanentes, uma vez que a sua consumação é imediata, ocorrendo no momento em que o sujeito ativo, por exemplo, edifica em área de preservação permanente. Contudo, os seus efeitos protraem-se no tempo, independentemente da vontade do agente.
Vejamos o magistério de Luiz Flávio Gomes e Sílvio Maciel sobre o tema:
“(…) Este crime do art. 48 é instantâneo, embora seus efeitos (a não regeneração da floresta ou vegetação) se estendam no tempo. O delito se aperfeiçoa no instante em que o agente pratica alguma conduta que interrompa o processo de regeneração natural em que está acontecendo. A doutrina em geral também entende se tratar de crime instantâneo. (Legislação Criminal Especial – 2. Ed. Ver., atual. E ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010 – p. 912)
Leciona Luiz Regis Prado, in verbis: “o momento consumativo se verifica com a efetivação das condutas de impedir ou dificultar a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação”. (Direito penal do ambiente, p. 345, Editora RT,2005).
No mesmo sentido é a doutrina de Luis Paulo Sirvinkas, a saber: “a consumação se dá com o efetivo obstáculo colocado à regeneração natural, impedindo ou dificultando a reconstrução por forca da própria natureza.” (Tutela penal do meio ambiente, p. 181, Editora Saraiva, 2004).
Em tal sentido, já decidiu a egrégia Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, consoante se verificada ementa a seguir transcrita:
“RECURSO ESPECIAL. PENAL. CRIME AMBIENTAL. ARTS. 40 E 48, AMBOS DA LEI N.º 9.605/98. DENÚNCIA. INDÍCIOS DE AUTORIA E MATERIALIDADE. AUSÊNCIA. CRIME INSTANTÂNEO DE EFEITOS PERMANENTES. OMISSÃO IMPRÓPRIA. DESCARACTERIZADA. DEVER DE AGIR IMPOSTO POR LEI. INCABÍVEL DEVER GENÉRICO IMPOSTO PARA TODA COLETIVIDADE.
A denúncia se baseia no laudo de exame de constatação de dano ambiental para comprovar o prejuízo do meio ambiente, entretanto, o próprio laudo não define a causa do desmatamento. A mera presunção a respeito de conduta delituosa não pode configurar o tipo penal em análise, impossibilitando o recebimento da denúncia.
Não se pode confundir crime permanente, em que aconsumação se protai no tempo, com delito instantâneo de efeitospermanentes, em que as consequências são duradouras.
Nos termos do art. 13, § 1.º, do Código Penal, a omissão é penalmente relevante quando o agente devia e podia agir para evitar o resultado, o que não é a hipótese dos autos.
A obrigação genérica atribuída a todos os cidadãos de preservar o meio ambiente para as gerações futuras, consoante o art. 225 da Constituição Federal, não se amolda ao dever imposto por lei de cuidar, proteger e/ou vigiar, exigido na hipótese de crime omissivo impróprio.
Recurso especial não conhecido. Concedido habeas corpus, de ofício, para declarar extinta a punibilidade estatal quanto ao crime previsto no art. 48 da Lei n.º 9.605/98, em face da ocorrência superveniente da prescrição da pretensão punitiva.
(REsp 897.426/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 27/03/2008, DJe 28/04/2008).” (g. n.).
Sobre o tema, a eminente Ministra Laurita Vaz, no julgado acima, destacou:
“Não prospera, ainda, a tese de que os “crimes são considerados de efeitos permanentes, cuja consumação se prolonga no tempo” (fl. 228) Observa-se que o ora Recorrente, de modo equivocado, data venia, uniu os conceitos de crime permanente com o de crime instantâneo de efeitos permanente. No primeiro, a consumação se protrai no tempo, conforme a vontade do sujeito ativo do delito, e, no segundo, as consequências duradouras não dependem do agente.
No caso em análise, seria um crime instantâneo de efeitos permanentes, já que existe a possibilidade de que o plantio de pastagem no local tenha causado dano ambiental, que poderia ser permanente. Não se pode falar que a consumação se prolongou no tempo, mas sim os efeitos da pretensa conduta delituosa.”
No mesmo diapasão, recente julgado do Tribunal de Justiça do Distrito Federal:
“PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. ARTS. 40, 48 E 64, TODOS DA LEI DE CRIMES AMBIENTAIS. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELA OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. ART. 48 DA LEI Nº 9.605/1998. CRIME INSTANTÂNEO DE EFEITOS PERMANENTES. DECISÃO MANTIDA. 1. O DELITO PREVISTO NO ART. 48 DA LEI DE CRIMES AMBIENTAIS CONSTITUI CRIME INSTANTÂNEO DE EFEITOS PERMANENTES, PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL APELAÇÃO Nº 154903/2013 – CLASSE CNJ – 417 – COMARCA DE TABAPORÃ DE MODO QUE A SUA CONSUMAÇÃO DÁ-SE DE IMEDIATO, EMBORA SEUS EFEITOS PROTRAIAM-SE NO TEMPO, INDEPENDENTEMENTE DA VONTADE DO AGENTE. ASSIM, MANTÉM-SE A DECISÃO RECORRIDA, QUE RECONHECEU A PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL QUANTO AO REFERIDO DELITO. 2. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJ-DF – RSE: 20070110469220 DF 0059823-86.2007.8.07.0001, Relator: JOÃO BATISTA TEIXEIRA, Data de Julgamento: 20/03/2014, 3ª Turma Criminal, Data de Publicação: Publicado no DJE : 25/03/2014 . Pág.: 350).” (g. n.)
Observe-se que a formação de pastagens, em tese, pode configurar o delito de impedir ou dificultar a regeneração vegetal (art. 48), mas o crime previsto no artigo 48 da Lei 9.605/98 está consumado desde que a grama foi plantada, sendo que a permanência da mesma sobre o solo nada mais é do que o prolongamento da situação danosa que já teve um instante em que se consumou, daí se iniciando a contagem do prazo prescricional.
Dessa forma, nos termos do art. 109, inciso V, do Código Penal, o prazo prescricional para o delito do art. 48 da Lei n.º 9.605/98 é de 2 (dois) anos.
Constata-se que não ocorreram causas interruptivas da prescrição, devendo o cômputo do prazo prescricional ocorrer a partir do dia em que se consumou o pretenso crime.
Destarte, conforme consignado na sentença recorrida, “considerando que o fato ocorreu no ano de 2005, conclui-se que a prescrição operou em 2009. Com efeito, não é mais possível a instauração de ação penal pelo crime em comento, em desfavor do denunciado, eis que atingido o tempo máximo para a persecução penal, sendo que ao tempo do recebimento da denúncia, 22/04/2010, a conduta já estava prescrita (…).”
Em que pese o MM. Magistrado sentenciante ter considerado a redação anterior do inciso VI, do art. 109, CPP (prescrição em 02 anos), não há relevância na motivação, pois na novel redação, o delito previsto prescreve no prazo de 03 (três) anos, o que ocorreu na hipótese, considerando a data do fato (ano de 2005), e a data de recebimento da denúncia 22/04/2010.
In casu, há que ser mantida a decretação da extinção da punibilidade do recorrido, pelo crime disposto no art. 48 da Lei Ambiental. 9.605/98.
Por todo exposto, nego provimento ao recurso de apelação criminal interposto pelo Ministério Público, mantendo-se incólume a decisão recorrida.
Custas na forma da lei.
É o voto.
V O T O (REVISOR)
Egrégia Câmara:
I – FATOS:
Consta na inicial acusatória que no dia 26 de outubro de 2007, na Fazenda Santa Terezinha localizada na estrada Ponto Rio dos Peixes , Km 80, zona rural de Tabaporã, agentes de fiscalização da SEMA, em diligência fiscalizatória, constataram que:
Fato 1- no ano de 2005 houve a danificação de 803,057 hectares de floresta nativa, objeto de especial preservação, qual seja, Floresta Amazônica, consoante revelado pela carta imagem do polígono 10459/SEMA/2005/52717 – violação ao art. 50 da Lei nº 9.605/98 ;
Fato 2 – o desmatamento levado a efeito no local implicou na danificação de 0,274 hectares de floresta considerada de preservação permanente, uma vez que, às margens de curso d’água – violação ao art. 38, caput, da Lei nº 9.605/98;
Fato 3 – desde aquela época desenvolve-se no local a atividade
econômica de formação de pastagens, para a prática de pecuária, de molde a impedir ou dificultar a regeneração da Floresta Amazônica – violação ao art. 48 da Lei nº 9.605/98;
Fato 4 – foi utilizado fogo em 500 hectares de área agropastoril, nas coordenadas geográficas S 11º 01’ 26,8” e W 56º 37’ 52,3”, sem autorização do órgão ambiental, o que causou poluição atmosférica de molde a provocar danos e mortandade da fauna e flora local – violação ao art. 54 da Lei nº 9.605/98.
II – SENTENÇA:
Pela decisão de fls. 183/187 se entendeu: a) atípica a conduta prevista no art. 54 da Lei nº 9.605/98 (desmate com uso de fogo em área agropastoril e em área de preservação permanente); b) prescritos os crimes dos arts. 48 e 50 da mesma fonte legislativa; c) absorvido o delito do art. 48 pelo do art. 38, ambos também da Lei nº 9.605/98.
III – RAZÕES:
Nas razões recursais de fls. 193/206 o Ministério Público almeja a reforma do decisum de modo que o recorrido seja processado e julgado também pelos crimes do art. 48 e 54 da lex supracitada.
IV – PARECER DA PROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA:
A cúpula ministerial opina pelo desprovimento do apelo (fls. 221/226).
V – CONCLUSÃO:
O voto é pelo desprovimento do recurso em consonância com o parecer da Procuradoria-Geral de Justiça.
I – Em relação ao crime descrito no art. 54 da Lei nº 9.605/98, não há, nos autos, prova técnica a indicar a ocorrência de poluição atmosférica de molde a provocar danos e mortandade da fauna e flora local. Assim, tendo em vista que a configuração do ilícito penal em alusão exige que a poluição seja provocada em níveis aptos a ensejar danos à saúde humana ou mortalidade de animais ou destruição na flora local, evidente que a inexistênciade elementos que comprovem a ocorrência de poluição nestes moldes, afasta a tipicidade da conduta.
Nesse sentido já decidi ao julgar, em 12/06/2013 pela Terceira Câmara Criminal deste Sodalício, o Recurso de Apelação nº 81.138/2011 .
II – No que concerne ao art. 48 da Lei nº 9.605/98, de igual sorte não há como processar e julgar o recorrido por sua eventual violação, pois, mesmo que estivesse incorreto o entendimento do magistrado a quo que entendeu que esta conduta foi absorvida pela descrita no art. 38 da mesma fonte legislativa, o que, frisa-se, não está, na instância de piso também se reconheceu, quanto ao aduzido art. 48, a ocorrência da prescrição, intelecção esta que não comporta reforma.
O preceito secundário do referido artigo prevê pena de detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, a qual segundo o art. 109, V, do CP, prescreve em 4 (quatro) anos.
A conduta penalmente relevante foi supostamente perpetrada em 2005, tendo sido a exordial acusatória recebida no dia 22/04/2010. Assim, evidente que entre a data dos fatos e a do primeiro marco interruptivo da prescrição existente no processo transcorreram mais de 4 (quatro) anos .
Não tem o condão de elidir tal raciocínio o argumento de que o crime em referência é permanente (cuja consumação se protrai no tempo), pois, sem embargo de intelecção diversa, perfilho o entendimento de que se trata de delito instantâneo com efeitos permanentes, o que, significa dizer que se consuma no instante em que é praticado, entretanto, seu efeito (a não regeneração da floresta ou vegetação) se protrai no tempo.
É como voto.