O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia, imputando ao acusado os crimes ambientais do artigo 38-A e art. 53, II, ”c”, ambos da Lei 9.605/1998.
Art. 38-A. Destruir ou danificar vegetação primária ou secundária, em estágio avançado ou médio de regeneração, do Bioma Mata Atlântica, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção:
Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.
Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena será reduzida à metade.
Art. 53. Nos crimes previstos nesta Seção, a pena é aumentada de um sexto a um terço se: […]
II – o crime é cometido: […]
c) contra espécies raras ou ameaçadas de extinção, ainda que a ameaça ocorra somente no local da infração;
Segundo o Ministério Público, a guarnição da Polícia Militar Ambiental constatou que o denunciado danificou vegetação secundária, integrante de Floresta Ombrófila Mista (Mata Atlântica), em estágio médio de regeneração natural, através do corte seletivo de vegetação nativa, mediante uso de motosserra e roçada, atingindo árvores nativas ameaçada de extinção, conforme Portaria n. 443/ 2014 do Ministério do Meio Ambiente.
O denunciado não possuía licença ou autorização do órgão ambiental competente para realizar a supressão das espécies vegetais.
A denúncia foi recebida e o acusado espontaneamente compareceu à audiência para a proposta de suspensão condicional do processo, mas recusou a proposta e apresentou resposta à acusação.
A defesa foi recebida e, não sendo caso de absolvição sumária, foi designada data e hora para audiência de instrução e julgamento, em que inquiridas as testemunhas arroladas pela acusação e defesa, bem como interrogado o acusado.
Encerrada a instrução processual e apresentadas as alegações finais pelo Ministério Público e pela defesa, sobreveio sentença com o seguinte dispositivo:
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE a denúncia, e por conseguinte, ABSOLVO o acusado das imputações que lhe foram atribuídas nestes autos, com fulcro no art. 386, VII, do Código de Processo Penal.
Irresignado, o Ministério Público interpôs recurso de apelação e razões recursais pugnando pela reforma da sentença para que o réu seja condenado nos termos da denúncia, mas o TJSC manteve a sentença de absolvição.
1. EMENTA
APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME AMBIENTAL. DANIFICAR VEGETAÇÃO SECUNDÁRIA EM ESTÁGIO MÉDIO DE REGENERAÇÃO DO BIOMA MATA ATLÂNTICA (ART. 38-A, DA LEI N. 9.605/1998). ABSOLVIÇÃO EM PRIMEIRO GRAU DE JURISDIÇÃO. INCONFORMISMO DO REPRESENTANTE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. PRETENDIDA A CONDENAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DAS ELEMENTARES DO TIPO. AUSÊNCIA DE PROVA TÉCNICA. NECESSIDADE DA CONFECÇÃO DE LAUDO PERICIAL POR EXPERT. PRECEDENTES DESTA CÂMARA. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
(TJ-SC – APR: 00011665320188240047 Tribunal de Justiça de Santa Catarina 0001166-53.2018.8.24.0047, Relator: Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt Schaefer, Data de Julgamento: 02/09/2021, Quinta Câmara Criminal)
2. LEIA O VOTO QUE MANTEVE A SENTENÇA DE ABSOLVIÇÃO DO CRIME AMBIENTAL
Trata-se de recurso de apelação criminal interposto pelo Ministério Público, o qual busca a reforma da sentença que absolveu o réu da imputação de cometimento da infração descrita no art. 38-A da Lei nº 9.605/ 98, c/ c art. 53, II, ”c”, ambos da Lei n. 9.605/1998.
Aduz o apelante que o acervo probatório é suficiente para comprovação da materialidade e autoria delitiva nos termos descritos na denúncia. Não obstante as argumentações do apelo, o pleito condenatório não merece guarida. O tipo penal imputado ao apelado estabelece que:
Art. 38-A. Destruir ou danificar vegetação primária ou secundária, em estágio avançado ou médio de regeneração, do Bioma Mata Atlântica, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção: Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.
Logo, a conduta típica é destruir/danificar vegetação primária ou secundária do Bioma Mata Atlântica. Neste diapasão, convém destacar o conceito de Bioma Mata Atlântica, segundo a legislação vigente (art. 2º, da Lei n. 11.428/06):
Art. 2º Para os efeitos desta Lei, consideram-se integrantes do Bioma Mata Atlântica as seguintes formações florestais nativas e ecossistemas associados, com as respectivas delimitações estabelecidas em mapa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, conforme regulamento: Floresta Ombrófila Densa; Floresta Ombrófila Mista, também denominada de Mata de Araucárias; Floresta Ombrófila Aberta; Floresta Estacional Semidecidual; e Floresta Estacional Decidual, bem como os manguezais, as vegetações de restingas, campos de altitude, brejos interioranos e encraves florestais do Nordeste.
Por sua vez, a definição de vegetação primária ou secundária e os estágios de regeneração se extrai da Resolução n. 04/1994 do CONAMA, vigente à época das intervenções realizadas na propriedade do apelado:
Art. 1º Vegetação primária é aquela de máxima expressão local, com grande diversidade biológica, sendo os efeitos das ações antrópicas mínimos, a ponto de não afetar significativamente suas características originais de estrutura e de espécies, onde são observadas área basal média superior a 20,00 metros quadrados por hectare, DAP médio superior a 25 centímetros e altura total média superior a 20 metros.
Art. 2º Vegetação secundária ou em regeneração é aquela resultante dos processos naturais de sucessão, após supressão total ou parcial da vegetação primária por ações antrópicas ou causas naturais, podendo ocorrer árvores remanescentes da vegetação primária.
Art. 3º Os estágios em regeneração da vegetação secundária a que se refere o artigo 6o. do Decreto 750/93, passam a ser assim definidos:
I – Estágio inicial de regeneração: a) Nesse estágio a área basal média é de até 8 metros quadrados por hectare; b) Fisionomia herbáceo/arbustiva de porte baixo; altura total média até 4 metros, com cobertura vegetal variando de fechada a aberta; c) Espécies lenhosas com distribuição diamétrica de pequena amplitude: DAP médio até 8 centímetros; d) Epífitas, se existentes, são representadas principalmente por líquens, briófitas e pteridófitas, com baixa diversidade; e) Trepadeiras, se presentes, são geralmente herbáceas; f) Serapilheira, quando existente, forma uma camada fina pouco decomposta, contínua ou não; g) Diversidade biológica variável com poucas espécies arbóreas ou arborescentes, podendo apresentar plântulas de espécies características de outros estágios; h) Espécies pioneiras abundantes; i) Ausência de sub-bosque; j) Espécies indicadoras: j.1) Floresta Ombrófila Densa:Pteridium aquilium (Samambaia- das-Taperas), e as hemicriptófitas Melinis minutiflora (Capim-gordura) e Andropogon bicornis (capim-andaime ou capim-rabo-de-burro) cujas ervas são mais expressivas e invasoras na primeira fase de cobertura dos solos degradados, bem assim as tenófitas Biden pilosa (picão-preto) e Solidago microglossa (vara-de-foguete), Baccharis elaeagnoides (vassoura) e Baccharis dracunculifolia (Vassoura-braba), j.2) Floresta Ombrófila Mista:Pteridium aquilium (Samambaia-das Taperas), Melines minutiflora (Capim-gordura), Andropogon bicornis (Capim-andaime ou Capim-rabo-de-burro), Biden pilosa (Picão-preto), Solidago microglossa (Vara-de-foguete), Baccharis elaeagnoides (Vassoura), Baccharis dracunculifolia (Vassoura-braba), Senecio brasiliensis (Flôr-das-almas), Cortadelia sellowiana (Capim-navalha ou macegão), Solnum erianthum (fumo-bravo). j.3) Floresta Estacional Decidual:Pteridium aquilium (Samambaia-das-Taperas), Melinis minutiflora (Capim-gordura), Andropogon bicornis (Capim-andaime ou Capim-rabo-de-burro), Solidago microglossa (Vara-de-foguete), Baccharis elaeagnoides (Vassoura), Baccharis dracunculifolia (Vassoura-braba), Senecio brasiliensis (Flôr-das-almas), Cortadelia sellowiana (Capim-navalha ou macegão), Solanum erianthum (Fumo-bravo).
II – Estágio médio de regeneração: a) Nesse estágio a área basal média é de até 15,00 metros quadrados por hectare; b) Fisionomia arbórea e arbustiva predominando sobre a herbácea podendo constituir estratos diferenciados; altura total média de até 12 metros; c) Cobertura arbórea variando de aberta a fechada, com ocorrência eventual de indivíduos emergentes; d) Distribuição diamétrica apresentando amplitude moderada, com predomínio dos pequenos diâmetros: DAP médio de até 15 centímetros; e) Epífitas aparecendo com maior número de indivíduos e espécies em relação ao estágio inicial, sendo mais abundantes na floresta ombrófila; f) Trepadeiras, quando presentes, são predominantemente lenhosas; g) Serapilheira presente, variando de espessura, de acordo com as estações do ano e a localização; h) Diversidade biológica significativa; i) Subosque presente; j) Espécies indicadoras: j.1) Floresta Ombrófila Densa:Rapanea Ferruginea (Capororoca), árvore de 7,00 a 15,00 metros de altura, associada a Dodonea viscosa (Vassoura-vermelha). j.2) Floresta Ombrófila Mista: Cupanea vernalis (Cambotá-vermelho), Schinus therebenthifolius (Aroeira-vermelha), Casearia silvestris (Cafezinho-do-mato). j.3) Floresta Estacional Decidual: Inga marginata (Inga feijão), Baunilha candicans (Pata-de-vaca).
III – Estágio avançado de regeneração: a) Nesse estágio a área basal média é de até 20,00 metros quadrados por hectare; b) Fisionomia arbórea dominante sobre as demais, formando um dossel fechado e relativamente uniforme no porte, podendo apresentar árvores emergentes; altura total média de até 20 metros; c) Espécies emergentes ocorrendo com diferentes graus de intensidade; d) Copas superiores horizontalmente amplas; e) Epífitas presentes em grande número de espécies e com grande abundância, principalmente na floresta ombrófila; f) Distribuição diamétrica de grande amplitude: DAP médio de até 25 centímetros; g) Trepadeiras geralmente lenhosas, sendo mais abundantes e ricas em espécies na floresta estacional; h) Serapilheira abundante; i) Diversidade biológica muito grande devido à complexidade estrutural; j) Estratos herbáceo, arbustivo e um notadamente arbóreo; k) Florestas nesse estágio podem apresentar fisionomia semelhante à vegetação primária; l) Subosque normalmente menos expressivo do que no estágio médio; m) Dependendo da formação florestal pode haver espécies dominantes; n) Espécies indicadoras: n.1) Floresta Ombrófila Densa:Miconia cinnamomifolia, (Jacatirão -açu), árvore de 15,00 a 20,00 metros de altura, formando agrupamentos bastante densos, com copas arredondadas e folhagem verde oliva, sendo seu limite austral a região de Tubarão, Psychotria longipes (Caxeta), Cecropia adenopus (Embaúba), que formarão os primeiros elementos da vegetação secundária, começando a aparecer Euterpe edulis (palmiteiro), Schizolobium parahiba (Guapuruvu), Bathiza meridionalis (Macuqueiro), Piptadenia gonoacantha (pau-jacaré) e Hieronyma alchorneoides (licurana), Hieronyma alchorneoides (licurana) começa a substituir a Miconia cinnamomifolia (Jacutirão-açu), aparecendo també Alchornea triplinervia (Tanheiro), Nectandra leucothyrsus (Canela-branca), Ocotea catharinensis (Canela-preta), Euterpe-edulis (Palmiteiro), Talauma ovata (Baguaçu), Chrysophylum viride (Aguai) e Aspidosperma olivaceum (peroba-vermelha), entre outras. n.2) Floresta Ombrófila Mista: Ocotea puberula (Canela guaica), Piptocarpa angustifolia (Vassourão-branco), Vernonia discolor (Vassourão-preto), Mimosa scabrella (Bracatinga). n.3) Floresta Estacional Decidual: Ocotea puberula (Canela-guacá), Alchornea triplinervia (Tanheiro), Parapiptadenia rígida (Angico-vermelho), Patagonula americana (Guajuvirá), Enterolobium contortisiliguum (Timbauva).
Nota-se que para comprovar a materialidade do crime imputado ao apelado, seria necessário demonstrar que a destruição supostamente causada por ele, atingiu uma das formações florestais ou ecossistemas definidos pelo dispositivo suso transcrito, bem como que a vegetação primária ou secundária estava em estágio médio ou avançado de regeneração, tendo em vista que tais circunstâncias são elementares do tipo penal.
Portanto, em virtude da complexidade dos conceitos trazidos pelo tipo legal supostamente infringido, se mostra necessário consultar profissional com conhecimento técnico específico, pois além da indispensável discriminação dos espécimes encontrados, mostra-se imprescindível atestar as condições na área degradada, sob pena de não ficar demonstrada a materialidade do delito em questão. Tal constatação só pode ser feita por profissional habilitado, mediante prova pericial.[1]
3. O QUE DIZ A DOUTRINA
Guilherme de Souza Nucci[2] assim analisa o núcleo do tipo:
Análise do núcleo do tipo: “destruir (eliminar), danificar (estragar, deteriorar) ou utilizar (fazer uso, tirar proveito de algo) são as condutas visadas de forma alternativa.
Logo, pode o agente destruir e danificar e utilizar parcelas do objeto tutelado e haverá a constituição de crime único, desde que no mesmo contexto. Pode, ainda, destruir ou danificar ou utilizar e, no mesmo prisma, ocorrerá delito único. Todas as condutas incriminadas dependem das normas de proteção ambiental, no caso previstas na Lei 11.428/2006.
O objeto protegido é a vegetação, primária ou secundária, em estágio avançado ou médio de regeneração, do Bioma Mata Atlântica (é o conjunto da vegetação predominante na Mata Atlântica).
Para efeito de destruição ou dano não se envolve o estágio inicial de regeneração da vegetação. No entanto, para fins de utilização, tendo em vista que a Lei 11.428/2006 protege todos os estágios, pode haver a criminalização da conduta de quem usa a vegetação em estágio inicial de regeneração, de maneira indevida.
O tipo penal difere do anterior (art. 38), pois cuida não somente da floresta, mas da vegetação em geral existente na Mata Atlântica. Logo, não deixa de ser um tipo especial em relação ao anterior. […]
Normal penal em branco: para o pleno conhecimento do alcance do tipo penal incriminador, torna-se essencial ter noção acerca das normas de proteção ambiental, particularmente voltadas à região da Mata Atlântica. Encontram-se na Lei 11.428/2006.
Como visto, o referido dispositivo é norma penal em branco e depende da análise conjunta da legislação extrapenal para definir as elementares configuradoras do delito.
Em outras palavras, somente a descrição do tipo penal imputado não é suficiente para caracterizar o crime, é preciso uma prova técnica amparada em lei extrapenal para esclarecer o que é vegetação primária ou secundária em estágio avançado ou médio de regeneração, do Bioma Mata Atlântica.
4. PRECEDENTES
In casu, vislumbra-se que não há nos autos a referida prova técnica, de modo a tornar impossível o reconhecimento da materialidade do delito, pois esta Relatoria mantém o entendimento de que a configuração do tipo penal em análise só ocorre se houver laudo pericial, confeccionado por expert no assunto, para determinar o estágio de regeneração da vegetação primária ou secundária, se é avançado ou médio, ou seja, sem o referido, impossível a configuração da materialidade e tipificação do delito.
Em casos semelhantes esta Quinta Câmara Criminal decidiu:
APELAÇÃO CRIMINAL. DESTRUIÇÃO DE VEGETAÇÃO SECUNDÁRIA DO BIOMA MATA ATLÂNTICA EM ESTÁGIO MÉDIO DE REGENERAÇÃO (LEI N. 9.605/1998, ART. 38-A). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA.PLEITO ABSOLUTÓRIO. ADUZIDA INSUFICIÊNCIA DE PROVAS QUANTO À MATERIALIDADE DOS FATOS. SUBSISTÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE LAUDO PERICIAL, ASSINADO POR PROFISSIONAL HABILITADO NO ASSUNTO, QUE ATESTE QUE A VEGETAÇÃO SUPRIMIDA ERA SECUNDÁRIA EM ESTÁGIO MÉDIO DE REGENERAÇÃO. RELATÓRIO, FOTOGRAFIAS E DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS AMBIENTAIS, SEM A CONFIRMAÇÃO DE UM PERITO, QUE SÃO INSUFICIENTES PARA AMPARAR A CONDENAÇÃO. PRECEDENTES DESTA CÂMARA. ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE (CPP, ART. 386, VII). RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJSC, Apelação Criminal n. 0900031-81.2018.8.24.0143, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Antônio Zoldan da Veiga, Quinta Câmara Criminal, j. 17-12-2020).
APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE. DESTRUIÇÃO DE VEGETAÇÃO SECUNDÁRIA, EM ESTÁGIO MÉDIO DE REGENERAÇÃO, DO BIOMA MATA ATLÂNTICA (LEI 9.605/1998, ART. 38-A, CAPUT). SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. INSURGIMENTO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA. ALMEJADA CONDENAÇÃO. AVENTADA EXISTÊNCIA DE PROVAS SUFICIENTES PARA ATESTAR A MATERIALIDADE E AUTORIA DO ILÍCITO. IMPROCEDÊNCIA. AUSÊNCIA DE LAUDO PERICIAL. IMPOSSIBILIDADE DE REALIZAÇÃO NÃO DEMONSTRADA. PARECER TÉCNICO QUE NÃO PODE SER SUPRIDO PELOS DEMAIS ELEMENTOS DE CONVICÇÃO COLIGIDOS AO FEITO. EXEGESE DOS ARTS. 158, CAPUT, E 167, AMBOS DO CÓDEX INSTRUMENTAL, E 19, CAPUT, DA NORMA DE REGÊNCIA. PRECEDENTES. ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DEFENSOR NOMEADO EXCLUSIVAMENTE PARA APRESENTAR AS CONTRARRAZÕES DO RECLAMO. VERBA DEVIDA. PRONUNCIAMENTO MANTIDO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.(TJSC, Apelação Criminal n. 0900017-57.2015.8.24.0061, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Luiz Cesar Schweitzer, Quinta Câmara Criminal, j. 29-10-2020).
APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE. ARTIGO 38-A DA LEI N. 9.605/98. SENTENÇA CONDENATÓRIA. INSURGÊNCIA DEFENSIVA. ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. AUSÊNCIA DE LAUDO TÉCNICO REFERENDADO POR EXPERT HABILITADO NA ÁREA. ELEMENTARES DO TIPO NÃO COMPROVADAS. PRECEDENTES DESTA CÂMARA. ABSOLVIÇÃO IMPERIOSA. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. “É cediço que os crimes que deixam vestígios exigem para comprovação da materialidade, conforme artigos 158 e 159 do Código de Processo Penal, a elaboração do exame de corpo de delito por perito oficial, o qual não pode ser suprido sequer pela confissão do acusado e, portanto, nos crimes ambientais não basta a confecção de relatório por um dos membros da Polícia Ambiental, sem qualquer qualificação técnica, incumbindo ao órgão estatal, ao verificar a ocorrência do dano ambiental, requerer a realização do laudo pericial a ser confeccionado por meio de expert” (TJSC, Apelação n. 0002670-14.2014.8.24.0022, de Curitibanos, rel. Des. Rodrigo Collaço, Quarta Câmara Criminal, j. 05-05-2016). (TJSC, Apelação Criminal n. 0001919-77.2011.8.24.0007, de Biguaçu, rel. Des. Luiz Neri Oliveira de Souza, Quinta Câmara Criminal, j. 11-07-2019).
5. CONCLUSÃO
Mesmo entendendo que a premissa não é absoluta, havendo entendimentos de que a materialidade pode ser comprovada por relatório ou outros documentos firmados por profissionais habilitados e com conhecimento na área ambiental, o que se vislumbra nos autos é a ausência de prova necessária para a configuração do elemento do tipo penal noticiado na denúncia.
Como se verifica, a caracterização dos estágios sucessionais demanda diversos aspectos da vegetação, tais como parâmetro da densidade do povoamento, pela área basal (área transversal das árvores na altura do peito – DAP), fisionomia arbórea e arbustiva predominante, distribuição diamétrica, cobertura arbórea, espécies dominantes, além de outros fatores.
Ocorre que não há laudo pericial subscrito por perito oficial e com conhecimento técnico específico, apto a demonstrar dano ou destruição de vegetação primária ou secundária, em estágio médio ou avançado de regeneração.
Desde a notícia crime, passando pelo auto de infração e de embargo, e o auto de constatação, foram todos lavrados/elaborados pela mesma pessoa, o Sargento da Polícia Militar Ambiental, que sequer foi arrolada para ser ouvida em juízo, e não há qualquer informação a respeito da sua formação ou conhecimento técnico especifico.
Outrossim, as testemunhas indicadas na Notícia Crime, e que teriam testemunhado a fiscalização do local do dano, e que foram ouvidas em juízo, afirmaram nada lembrar a respeito do fato narrado na denúncia.
Portanto, não há comprovação satisfatória da ocorrência do crime ambiental narrado na denúncia, já que demanda conhecimento técnico específico, sendo assim imprescindível a realização de perícia técnica na área do suposto dano ambiental.
De fato, considerando os termos do disposto no art. 158, do CPP, quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado e que nos delitos ambientais o corpo de delito é consubstanciado no laudo pericial que demonstrará a existência da própria materialidade delitiva é de se considerar que no caso em análise tal prova inexiste, eis que as elementares do tipo não estão descritas por nenhum expert.
Convém salientar que o trabalho da Polícia Militar é de relevante valor, contudo se faz necessário que o trabalho de fiscalização seja referendado por laudo pericial elaborado por expert, podendo ser inclusive por um policial militar, contudo que demonstre ser graduado ou especialista na área e habilitado técnica ou cientificamente para elaboração de laudo ambiental, o que não se vislumbra nos autos.
Assim, ante a falta de laudo pericial para determinar a materialidade do delito com a certeza necessária, a mantença da absolvição é medida que se impõe.
Ante o exposto, voto no sentido de conhecer e negar provimento ao apelo.
[1] TJSC, Apelação Criminal n. 2011.031654-3, de Descanso, rel. Des. Roberto Lucas Pacheco, j. 04-10-2012.
[2] Leis penais e processuais penais comentadas / Guilherme de Souza Nucci. 7. ed. rev. atual e ampl. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 566/567.