DIREITO ADMINISTRATIVO – DIREITO PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO ADMINISTRATIVO – APLICAÇÃO DE MULTA POR INFRAÇÃO AMBIENTAL – PROCESSO ADMINISTRATIVO – JULGAMENTO DE RECURSO ADMINISTRATIVO – DESMEMBRAMENTO DA ÚNICA INFRAÇÃO CONSTANTE DO AUTO DE INFRAÇÃO – CARACTERIZAÇÃO DE CINCO INFRAÇÕES AUTÔNOMAS – NOVOS AUTOS DE INFRAÇÃO – INADMISSIBILIDADE – APARENTE VIOLAÇÃO DO DIREITO À DEFESA – RECURSO PROVIDO.
Se a agravante foi autuada ante a prática de suposta infração ambiental, caracterizando um único auto de infração, a cisão deste no julgamento do recurso administrativo constitui, a princípio, afronta ao princípio da ampla defesa, uma vez que a recorrente teve a oportunidade de se defender administrativamente apenas em relação ao auto de infração originário, e não em relação aos 05 (cinco) autos de infração resultantes do desmembramento.
(TJ-MG – AI: 10000191617281001 MG, Relator: Moreira Diniz, Data de Julgamento: 20/08/2020, Data de Publicação: 21/08/2020)
Cuida-se de agravo de instrumento contra decisão da MM. Juíza da 1ª. Vara Empresarial e de Fazenda Pública da comarca de Montes Claros, que, nos autos de uma “ação anulatória de ato administrativo indeferiu o pedido de tutela provisória, que consistiria em determinação para que o réu se abstivesse de inscrever o valor da multa em dívida ativa, até o trânsito em julgado da ação.
A agravante alega que, embora a autuação inicial tenha ocorrido em razão da prática de apenas uma suposta infração ambiental, no julgamento do recurso administrativo a Câmara Recursal desmembrou a única infração constante do auto de infração em 05 (cinco) infrações de natureza grave, aplicando multa de R$50.000,00 para cada uma.
Alegou que “tal expediente, evidentemente, eivou o processo de nulidade insanável, uma vez que, além de inexistir qualquer previsão legal que autorize o órgão julgador municipal a fragmentar e reclassificar a imputação lançada no Auto de Infração (princípio da legalidade), ainda não foi oportunizada à Agravante a possibilidade de apresentar defesa quanto às novas imputações, haja vista que não foram expedidos novos Autos de Infração em relação às outras 04 (quatro) novas penalidades impostas pelo Agravado”;
Disse que “a nulidade insanável surgiu justamente no julgamento do recurso, quando a municipalidade inovou no processo administrativo, imputando à Agravante penalidade diversa daquela da qual foi autuada, sem que lhe fosse possível manifestar novamente nos autos, uma vez que não foram expedidos novos Autos de Infração e tampouco foi reaberto para manifestação, em flagrante violação aos princípios da legalidade, devido processo legal, contraditório, ampla defesa e da não surpresa”;
Informa ainda, que não foram descritos e individualizados os fatos que supostamente ensejaram a autuação, a qual se fundamenta de maneira genérica em 13 (treze) dispositivos legais, que correspondem praticamente à integralidade da legislação ambiental municipal, o que inviabiliza o pleno exercício do direito de defesa;
Segundo a Agravante, os 05 (cinco) dispositivos legais aleatoriamente escolhidos pelo Município, dentre os 13 (treze) constantes do auto de infração para a aplicação das 05 (cinco) penalidades, se sobrepõem, uma vez que todos decorrem da mesma conduta, devendo ser considerados em conjunto, e não separadamente, sob pena de gerar indevido bis in idem;
E ainda, que não consta no auto de infração a descrição fática das circunstâncias em que a agravante teria incorrido nas alegadas infrações ambientais, o que também prejudica seu direito de defesa, enfatizando a nulidade do auto de infração;
Que não se pode exigir a realização de depósito judicial do valor do suposto débito para suspender sua exigibilidade, pois as normas do Código Tributário Nacional não se aplicam na cobrança de créditos não tributários, como é o caso;
E ainda que se entenda pela aplicabilidade do Código Tributário Nacional, o artigo 151 da referida norma prevê que, além do depósito do montante integral do crédito, a concessão de medida liminar ou de tutela antecipada suspende a exigibilidade do crédito tributário, o que se aplica ao caso em exame.
Analisando o processo, verifica-se que a agravante foi autuada pelo Município (auto de infração), ante a suposta prática de infração ambiental classificada como de natureza gravíssima, sendo-lhe aplicada inicialmente uma multa no valor de R$500.000,00.
Após a apresentação de defesa administrativa, a referida multa foi reduzida para o montante de R$250.000,00.
A agravante, então, interpôs recurso administrativo, cujo julgamento, realizado pela Câmara Recursal do CODEMA do Município, resultou no desmembramento da infração de natureza gravíssima em 05 (cinco) infrações de natureza grave.
Como fundamento, os conselheiros que participaram do referido julgamento destacaram, em síntese, que o auto de infração indicou vários incisos do artigo 96 da lei municipal 3.754/04 e do artigo 83 do decreto 2.568/08, e que cada inciso corresponderia a uma conduta delituosa, razão pela qual poderia ser realizada a correção do equívoco, com o desmembramento do auto de infração em 05 (cinco) infrações de natureza grave, cada uma com multa de R$50.000,00, totalizando o valor de R$250.000,00.
É possível verificar que, no auto de infração foi apontada a ocorrência de “infração ambiental de natureza gravíssima, conforme previsto na Lei Municipal 3.754/04 e em seu art. 96 inciso I, II, III, VII, VIII, IX, e decreto regulamentador 2.568/2008 – artigo 83 – incisos I, XI, XII, XIII, XVIII, XXII, XXIII; artigo 84”.
Nesse contexto, embora o auto de infração tenha feito menção às normas ambientais supostamente violadas pela agravante, entendo que, ao menos a princípio, não poderia ter ocorrido o desmembramento do referido auto de infração no julgamento do recurso administrativo.
Afinal, a cisão do auto de infração quando do julgamento do recurso administrativo constitui, a princípio, afronta ao princípio da ampla defesa, uma vez que a agravante teve a oportunidade de se defender administrativamente apenas em relação ao auto de infração originário, e não em relação aos 05 (cinco) autos de infração resultantes do desmembramento.
Aliás, cada um dos incisos apontados no auto de infração constituiria, em tese, e segundo a autoridade administrativa, uma conduta distinta.
Assim, como a agravante foi autuada originalmente em relação a uma infração ambiental, e se defendeu administrativamente no tocante a essa única conduta, me parece equivocado o desmembramento do auto de infração.
Em suma, ante a grave dúvida sobre a correção do procedimento que gerou a aplicação da multa em desfavor da agravante, entendo ser necessária a concessão da liminar, para suspender os efeitos da decisão que aplicou a multa ambiental, cujo registro e exigibilidade ficam suspensos.
Ante o exposto, dou provimento ao agravo, para suspender os efeitos da decisão que aplicou a multa ambiental em debate, cujo registro e exigibilidade ficam suspensos.