ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DESMATAMENTO IRREGULAR. Danos ambientais. Dano moral coletivo. Alegada violação ao art. 1.022 do CPC/2015. Inexistência de vícios, no acórdão recorrido. Inconformismo. Configuração de ofensa a valores fundamentais da coletividade. Acórdão recorrido que, à luz das provas dos autos, concluiu pela não ocorrência de dano moral coletivo. impossibilidade de revisão, na via especial. Súmula 7/STJ. Agravo interno improvido.
(STJ – AgInt no ARESP: 1678409 MG 2020/0063228-0, Relator: Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, Data de Julgamento: 24/08/2020, T2 – SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 16/09/2020).
VOTO
Não obstante os combativos argumentos da parte agravante, as razões deduzidas neste Agravo interno não são aptas a desconstituir os fundamentos da decisão atacada, que merece ser mantida.
Na origem, trata-se de Ação Civil Pública, ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais em face da parte agravada, com o objetivo de obter a reparação de danos causados ao meio ambiente por desmatamento irregular.
O acórdão reformou, em parte, a sentença, para julgar improcedentes os pedidos de indenização por danos morais coletivos e lucros cessantes.
Nas razões do Recurso Especial, interposto com base no art. 105, III, a, da Constituição Federal, a parte agravante aponta violação aos arts. 1.022, II, do CPC/2015, 14, § 1º, da Lei 6.938/81 c/c arts. 1º, I, da Lei 7.347/85, sustentando que: (a) mesmo com a oposição dos Embargos de Declaração, não foram sanados os vícios indicados; (b) “o dano moral coletivo é manifesto. Isso porque, o caso em tela evidencia o corte de 25 árvores de espécies diversas, sem a devida licença ambiental, com grande prejuízo ao meio ambiente” (fl. 358e); (c) “basta a comprovação do dano e do nexo de causalidade entre o dano e a atividade exercida pelo poluidor para gerar sua responsabilidade pela indenização e reparação, sem que seja necessária qualquer discussão a respeito de eventual culpa pela causa da poluição” (fl. 361e).
Verifica-se que o acórdão recorrido não incorreu em qualquer omissão, como ora alega a parte recorrente, uma vez que o voto condutor do julgado apreciou, fundamentadamente, todas as questões necessárias à solução da lide, dando-lhes, contudo, solução jurídica diversa da pretendida pelo agravante.
Assim, o acórdão de 2º Grau conta com motivação suficiente e não deixou de se manifestar sobre a matéria cujo conhecimento lhe competia, permitindo, por conseguinte, a exata compreensão e resolução da controvérsia, não havendo falar em descumprimento ao art. 1.022 do CPC/2015.
Nesse contexto, “a solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 1.022 do CPC/2015” (STJ, REsp 1.669.441/PE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 30/06/2017).
Vale ressaltar, ainda, que não se pode confundir decisão contrária ao interesse da parte com ausência de fundamentação ou negativa de prestação jurisdicional. Nesse sentido: STJ, REsp 801.101/MG, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 23/04/2008.
A propósito, ainda:
“PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL.
DENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 1.022 DO CPC/2015. NÃO OCORRÊNCIA. REAJUSTE DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. EMENDAS CONSTITUCIONAIS 20/1998 E 41/2003. ACÓRDÃO DE ÍNDOLE EMINENTEMENTE CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. MULTA DO ARTIGO 1.021, § 4º, DO CPC/2015. EXCLUSÃO. INADMISSIBILIDADE OU IMPROCEDÊNCIA DO AGRAVO INTERNO INTERPOSTO NA ORIGEM. NÃO VERIFICAÇÃO. OPOSIÇÃO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. IMPOSIÇÃO DE MULTA. EXCLUSÃO. PROPÓSITO DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 98/STJ. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, PARCIALMENTE PROVIDO.
1. O acórdão recorrido apreciou fundamentadamente a controvérsiados autos, decidindo, apenas, de forma contrária à pretensão do recorrente, não havendo, portanto, omissão ensejadora de oposição de embargos de declaração, pelo que, deve ser rejeitada a alegação de violação ao artigo 1.022 do CPC/2015.
(…)
6. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, parcialmente provido” (STJ, REsp 1.672.822/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 30/06/2017).
“PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC/2015 NÃO CONFIGURADA. REAJUSTE DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. EMENDAS CONSTITUCIONAIS 20/1998 E 41/2003. ACÓRDÃO RECORRIDO QUE DECIDE COM FUNDAMENTO EXCLUSIVAMENTE CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA DO STF. EMBARGOS PROTELATÓRIOS. VIOLAÇÃO AO ART. 1.026, § 2º, DO CPC/2015. MULTA AFASTADA.
1. Inicialmente, quanto à alegação de violação ao artigo 1.022 doCPC/2015, cumpre asseverar que o acórdão recorrido manifestou-se de maneira clara e fundamentada a respeito das questões relevantes para a solução da controvérsia. A tutela jurisdicional foi prestada de forma eficaz, não havendo razão para a anulação do acórdão proferido em Embargos de Declaração apenas pelo fato de a Corte ter decidido de forma contrária à pretensão do recorrente.
2. Quanto à questão de fundo, isto é, a revisão do benefício previdenciário observando os valores dos tetos estabelecidos nas Emendas Constitucionais 20/1998 e 41/2003, o recurso não merece que dela se conheça. Com efeito, verifica-se que o acórdão recorrido negou provimento à apelação com fundamento em precedentes do Supremo Tribunal Federal. Dessa forma, dada a natureza estritamente constitucional do decidido pelo Tribunal de origem, refoge à competência desta Corte Superior de Justiça a análise da questão, sob pena de usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal.
3. A irresignação merece acolhida em relação à alegada ofensa ao art. 1.026, § 2º, do CPC/2015 nos termos da Súmula 98 do STJ, in verbis: ‘Embargos de declaração manifestados com notório propósito de prequestionamento não têm caráter protelatório’. No caso dos autos, os Embargos de Declaração ofertados na origem tiverem tal propósito, de maneira que deve ser excluída a multa fixada com base no supracitado dispositivo legal.
4. Recurso Especial parcialmente provido” (STJ, REsp 1.669.867/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 30/06/2017).
Portanto, ao contrário do que pretende fazer crer a parte embargante, não há que se falar em negativa de prestação jurisdicional.
Na forma da jurisprudência do STJ, “é possível exigir-se a comprovação da violação de valores fundamentais da coletividade para configuração do dano moral coletivo, o que não se confunde com a demonstração dos abalos psicológicos experimentados por seus membros” (STJ, AgInt no REsp 1.297.882/GO, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, DJe de 15/10/2019).
Como destacou a decisão ora agravada, o Tribunal de origem, com base no exame dos elementos fáticos dos autos, assim concluiu, em relação ao dano moral coletivo:
“Em análise dos autos, ouso dissentir do voto do e. relator em relação à condenação em danos morais coletivos pelos motivos que se seguem.
Verifico que o Superior Tribunal de Justiça reformou o acórdão de f. 131-137 para reconhecer a possibilidade, em tese, de cumulação de indenização pecuniária com as obrigações de fazer (e não fazer) voltadas à recomposição do dano ambiental.
Em razão disso, determinou o retorno dos autos ao Tribunal de origem para analisar se no caso há dano indenizável e, havendo, seja fixado o valor da indenização a ser paga.
Assim, tem-se que não foi reconhecida a existência de dano moral indenizável, apenas ressaltou a possibilidade de cumulação, conforme acórdão de f. 249v-252.
Primeiramente, ressalvo meu entendimento no sentido de que a responsabilidade civil por dano ambiental é objetiva, a teor do que dispõe o art. 14, § 1º Lei 6.938, de 1981:
(…) Contudo, tal ressalva em nada altera o resultado do julgamento em relação à obrigação de recomposição do dano e indenização por danos materiais, visto que restou comprovado o ato ilícito, consubstanciado no corte de 25 árvores de espécies diversas, sem a devida licença ambiental, e com prejuízo para o meio ambiente.
Apesar de manter a sentença e acompanhar o voto do relator quanto ao dever de recomposição do meio ambiente degradado e condenação em danos materiais, tenho por indevida a condenação em danos morais coletivos. Explico.
Como bem pontuado, o meio ambiente equilibrado é de direito fundamental, indisponível, comum a toda a humanidade (art. 225 da Constituição da República). Logo, a violação deste direito por um indivíduo enseja o dever da respectiva reparação, inclusive de ordem moral, porém, devem estar comprovados os requisitos para tanto.
Emerge, pois, verificar se a degradação ambiental promovida ultrapassou os limites físicos da reparação determinada na sentença é alçou o patamar de dano moral coletivo. (…)
Validamente, o dano moral coletivo ocorrerá quando houver agressão a direitos fundamentais difusos, transindividuais, com repercussão na esfera subjetiva.
E especificamente para o dano moral coletivo ambiental sucederá quando além da repercussão física no patrimônio ambiental houver ofensa ao sentimento difuso ou coletivo.
Ocorre que, apesar do reconhecimento do dano ambiental provocado, o caso dos autos não autoriza a condenação do réu ao pagamento de valores por dano moral coletivo, pois não restou comprovada situação excepcional ensejadora de sofrimento coletivo, nem mesmo a irreparabilidade ao meio ambiente.
Neste ponto, comungo do entendimento externado no acórdão de f. 131-137, no sentido de que:
Observo que os apelantes, quando desmataram área de reserva florestal, adotaram conduta antijurídica lesiva ao meio ambiente. Porém, conforme anotado, o dano moral ambiental foi somente potencial, não lesou pessoas determinadas e nem causou impacto direto na comunidade local. Logo, a indenização por dano moral ambiental é mesmo incompatível com a noção de transindividualidade. Assim, tem pertinência a irresignação.
Portanto, reformo a sentença para julgar improcedente o pedido de indenização de danos morais coletivos.
Em relação aos lucros cessantes, acompanho o voto do relator, porquanto não restaram comprovados nos autos, razão pela qual também deve ser julgado improcedente o pedido neste sentido.
Neste contexto, conquanto seja possível a cumulação da condenação da recuperação da área com indenização pecuniária, tenho que não restaram comprovados os requisitos para que se pudesse confirmar a sentença quanto aos danos morais coletivos e lucros cessantes.
À luz destas considerações, redobrando vênia ao relator, dou parcial provimento ao recurso de apelação para reformar a sentença e julgar improcedentes os pedidos de indenização por danos morais coletivos e lucros cessantes. Mantenho quanto ao mais a sentença por seus jurídicos fundamentos”.
Nesse contexto, considerando a fundamentação do acórdão objeto do Recurso Especial, os argumentos utilizados pela parte recorrente somente poderiam ter sua procedência verificada mediante o necessário reexame de matéria fática, não cabendo a esta Corte, a fim de alcançar conclusão diversa, reavaliar o conjunto probatório dos autos, em conformidade com a Súmula 7/STJ.
A propósito, confira-se o seguinte precedente, aplicável, mutatis mutandis, ao caso dos autos:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL.DANO MORAL COLETIVO. NÃO DEMONSTRAÇÃO DE EFETIVO PREJUÍZO. SÚMULA 7/STJ.
1. A revisão da conclusão a que chegou o Tribunal a quo sobre a questão da demonstração da ocorrência de dano moral coletivo, demanda o reexame dos fatos e provas constantes dos autos, o que é vedado no âmbito do recurso especial, nos termos da Súmula 7/STJ. 2. Agravo interno não provido. (STJ, AgInt no AREsp 518.870/PB, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, DJe de 22/09/2016).
Assim, incensurável a decisão ora agravada, que deve ser mantida, por seus próprios fundamentos.
Ante o exposto, nego provimento ao Agravo interno.
É o voto.